Cuamba! Antiga Nova Freixo! A quatro centenas de quilómetros de Nampula, assim como de Lichinga. Dizem que até ao Gurúè são apenas duas horas de carro.
Mal cheguei a Cuamba instalaram-me na casa azul. Será que tem luz? Será que tem água? Perguntar se tem internet é como perguntar numa pensão em Portugal se tem piscina de água quente. Portanto, não perguntei. Porque seria uma pergunta sem contexto.
Ia almoçar e jantar à paróquia S. Miguel que dista daqui uns 15 minutos a pé.
Logo no primeiro dia, lá ia eu com a minha saquita às costas, onde levo sempre uma máquina fotográfica e um caderno de apontamentos, e uma criança mesmo pequena atira: olá branco. Olhei para ela. Deu-me vontade de dizer olá pretinho, mas calei-me.
No entanto, os voluntários dehonianos que estiveram cá em 2010 a trabalhar em bibliotecas falavam muito no P. Leonel e no P. Rogélio. Eu nunca os tinha visto. Apenas algumas fotos.
Chegava eu de avião e estava no aeroporto de Nampula à espera da mala. Vejo um indivíduo cuja cara não me era estranha. Você chama-se Leonel? Sim. Ah É o padre Leonel. Sim. Sou. Assim fiquei a conhecer um dos padres mais falados pelos voluntários dehonianos.
Estava eu já a pensar vir para Cuamba de comboio, mas eis que a Ir Marli organizadora do congresso que eu vou intervir, a dizer que o P. Leonel vem para Cuamba e dá-me boleia. Óptimo. Assim foi. Segunda-feira dia 21 de Novembro às 5 horas da manhã em ponto, arrancamos de Nampula para chegarmos aqui a Cuamba pelas 12 horas.
Paramos apenas uma vez, porque um polícia pôs-se no meio da estrada, obrigando-nos a parar. Queria boleia para o posto de trabalho dele. Lá levamos o homem uns bons 15 quilómetros no meio de buracos e pedras.
O P. Rogélio? Estava eu a escrever no meu caderno estas notas sentado numas cadeiras mesmo fora do refeitório da paróquia e eis que entra um padre: chamo-me P. Rogélio e estou agora em Mecanhelas. E lá falou do Eduardo, da Maria, do Paulo, da Natália, do Rogério e do fotógrafo de Arouca. É que veio para uma reunião dos padres da Consolata aqui no norte de Moçambique, onde estava também o P. Frizzi que escreve muito sobre os macuas. É um tipo Elias Ciscato cá do Niassa.
Também estava ali sentado, porque uma antiga leiga para o desenvolvimento, disse que queria falar comigo às 17 horas. Esperei. Esperei. Não apareceu…Pois…
No dia a seguir, uma brasileira, Raimundinha, leiga consagrada, mulher de chás de plantas medicinais, convidou-me a ir a Mitúcuè, antiga missão da Consolata, que tem hoje à sua volta 66 comunidades que funciona como segunda paróquia. Ali a Raimundinha apresentou-me uma árvore que se chama Índia e que tem efeitos medicinais para a malária, parasitas intestinais, pele e anticonceptivos.
Bem, a paróquia aqui em Cuamba chama-se S. Miguel Arcanjo e tem à sua volta 96 comunidades cristãs.
Aqui Cuamba está em tempo de eleições. O administrador demitiu-se e então há um candidato da Frelimo (homem) e um candidato do MDM (mulher). São bandeiras, carros da Frelimo a passar, já que ao que me parece o único carro do MDM que anda a fazer propaganda é o carro do pai da candidata já que o resto é à base de bicicletas.
Ainda hoje, estávamos para ir almoçar e aparece a ministra do ambiente de Moçambique para falar com o pároco e pedir-lhe para que peçam ao povo para não haver violência durante a campanha.
Pois no primeiro dia, foram vários feridos para o hospital….
Para impressionar o povo estão a substituir os postes de electricidade da cidade. Tiram os de cimento que estão bons e colocam uns de madeira que daqui a algum tempo caem de podres…
E os caminhos cheios de pó, bandeiras a voar no meio do pó, cá estamos nós nesta terra, a ouvir de vez em quando o comboio a apitar, ou porque está a fazer manobras, ou porque está a experimentar o apito, ou a sair para Cuamba ou para Lichinga (de mercadorias e uma vez por mês).
E agora vou dormir ao som do apito do comboio, porque amanhã então na Faculdade de Agricultura de Cuamba começo as minhas conferências sobre o papel da educação no desenvolvimento da sociedade para professores do secundário e da universidade.
…
Assim, foi todo o dia de hoje na Universidade a discursar e a dialogar sobre a educação. O problema foi convencer um professor de que a mentira não é um valor nem se deve praticar. Dizia ele: se estou preso, peço ao guarda para ir à casa de banho, depois fujo. Esta mentira para sair da cadeia é correcta diz ele. E eu perguntei: e você é professor? Pois sou, diz ele. E eu respondi: pois.
Fiquei mal impressionado com o que me disseram: que os professores em Cuamba estão sempre Mal apresentados e bebem de mais. Espero que alguma coisa tinha ficado hoje depois de falarmos de educação, desenvolvimento, sociedade, escola contemporânea.
Do Seminário e da viagem de comboio Cuamba Nampula falarei depois. É um espectáculo.
Cuamba, a capital do algodão.
Cuamba, 27 de Novembro de 2011
Adérito Barbosa
Obrigada por este texto!
ResponderEliminarFez-me recordar Cuamba, quando lá vivi nos anos 70. Vivi em Cuamba durante 27 meses e foram uns anos maravilhosos! Que saudades tenho.
Se tiver mais fotos de Cuamba, agradeço que me envie para menaribeiro@hotmail.com
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Filomena Ribeiro